5.2.09

O desembarque holandês no rio Potengi.


Gravura flamenga do Livro de Barléu
No mesmo dia em que ocorreu o desembarque holandês na antiga praia de Ponta Negra (hoje correspondente a Areia Preta) – 8 de dezembro de 1633, um dia de 5ª feira, cuja maré cheia verificou-se às 10 e meia da manhã - , parte das tropas dirigiu-se à barra do Rio Grande (Potengi), embarcada em diversos navios sob o comando de Jan Cornelissen Lichthart, conduzindo também os senhores Van Keulen, ten.cel. Balthasar Bymae e Carpentier. A esquadra veio impusionada pelos ventos leste e norte, pretendendo a conquista do Forte dos Santos Reis, situado na barra daquele rio.
Quando os navios holandeses demonstraram a intenção de penetrar a barra do rio, a artilharia do Forte dos Santos Reis Magos passou prematuramente a atirar com os seus canhões, o que não impediu a manobra dos invasores. Chegados à distância conveniente do forte, os navios flamengos passaram a responder ao fogo português, com fúria e precisão.
Os holandeses encontraram junto ao forte duas caravelas fundeadas, cujos tripulantes portugueses as abandonaram, ante a aproximação da esquadra flamenga. O comandante Lichthart, já tendo penetrado no rio, determinou então fossem cortadas as amarras que retinham as duas caravelas abandonadas, tendo-as aprisionado e incorporado à esquadra flamenga.
Era plano dos invasores desembarcar a companhia que vinha a bordo, em certo local à margem esquerda do rio, com a finalidade de cortar o abastecimento d`água dos defensores do forte. Tal manancial de água potável correspondia ao rio da Redinha, cujas águas desembocavam na praia do mesmo nome, no Potengi. Todavia, verificaram ser desnecessária tal providência, pois os próprios botes dos navios poderiam impedir a aproximação dos portugueses, que pretendessem procurar aquele manancial d`água.
Ocorreu então o desembarque das tropas, que formavam uma única companhia, na margem direita do Potengi. Vieram-se-lhes juntar cerca de 150 marinheiros armados de mosquetes e sabres. Marcharam então em direção ao forte, chegando a uma duna de areia nas proximidades da fortificação, onde existia um poço d`água, que à época, abastecia do precioso líquido as tropas aquarteladas no Santos Reis. Ali acampou o comandante, ficando no aguardo das outras tropas flamengas que haviam desembarcado naquele mesmo dia, na Ponta Negra.
Logo em seguida começaram os combates entre os invasores e as tropas da fortaleza, em que foram utilizados canhões e mosquetes. Pelas três horas da tarde, chegaram àquela duna as tropas vindas da Ponta Negra, as quais se aquartelaram por detrás do médão, devidamente protegidas do fogo proveniente do Santos Reis.
Deixaremos de lado os diversos episódios ocorridos entre os dias 8 a 12 de dezembro de 1633, período em que decorreu o assédio do forte, culminado com a rendição do lado português e a vitória dos flamengos. Tal descrição fugiria ao nosso objetivo, ou seja, identificar a parte geográfica relacionada com o desembarque flamengo no rio Potengi.
Desenhos holandeses, um deles de Commelyn e o outro apresentado no livro de Laet, descrevem a paisagem e a conquista do Rio Grande, documentos de que nos utilizaremos para completar o quadro já descrito.
Em uma das gravuras vêem-se alguns navios holandeses fundeados no oceano, ao nascente da fortaleza. À altura do rio da Redinha, então navegável (Versche Riever), aparecem duas caravelas portuguesas, aprisionadas, subindo o Potengi rebocadas por duas canoas flamengas movidas a remo. À frente das duas canoas, segue uma outra embarcação similar. O grosso da esquadra flamenga achava-se ancorada em um ponto, à margem direita do Potengi, no local onde desembocava um certo riacho provindo da antiga Lagoa do Jacó, no porto hoje denominado de Canto do Mangue.
Ao sudoeste do forte havia um renque de dunas, aquelas mesmas em que os holandeses colocaram os seus canhões. Segundo informações coevas, as dunas tinham a altura de 60 pés (19,8m), superando o nível do forte: “Este forte está sujeito às dunas que lhe ficam a tiro de arcabuz, e são tão elevadas que delas se pode ver pelas canhoneiras o terrapleno, e daí fuzilar os do castelo, que se dirigem para as muralhas”.
Na gravura intitulada Verovinge van Rio Grande in Brasil Anno 1633 (Assédio do Rio Grande no Brasil Ano 1633), divisam-se os alojamentos flamengos, por detrás e ao sudoeste das dunas.
Na gravura holandesa executada por Commelyn, intitulada Afbeeldinghe van T´Forte op Rio Grande ende Belegeringhe (Planta do Forte do rio Grande e arredores), já figura o Fort Tres Reys convertido no Fort Ceulen. Sobre as dunas três baterias, uma delas de morteiros.
Exatamente ao sudoeste do Fort Keulen, existia o Het Quartier van ous volck, o quartel do nosso pessoal, vizinho e ao poente do qual, via-se o Logement vande K. Mathias van Ceulen, o alojamento do comandante Van Keulen.
No livro de Barléu figura um mapa, intitulado Castrum Ceulanium, de alto valor informativo: ali vêem-se o Castellum e as pedras que as marés altas inundam, os arrecifes, a típica vegetação do terreno arenoso, as pedras submersas junto à entrada da barra.
Também as instalações de uma indústria de cal, Fornax conficiendae calcis, no terreno hoje ocupado pelo 17º G.A.C. Ademais, o canal de navegação do rio Potengi, as indicações exatas sobre a profundidade da barra, e alguns poços d’água doce, aquae dulces.
Na parte correspondente à atual praia da Redinha, vêem-se algumas casinhas à beira do Potengi, pertencentes a pescadores. À esquerda da gravura, havia os Montes Excelsi, abaixo dos quais corria um riacho, antigamente chamado de riacho da limpa, hoje desaparecido completamente.
Por Olavo de Medeiros Filho.

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