17.10.09

Natal - Geração 70 (*)


Existiram gerações que pareciam fervilhar de ideias, em favor de um futuro melhor. A geração 1970, ou simplesmente "geração 70", foi uma dessas, que marcaram época. Novos costumes foram sendo incorporados à cidade, que começava a perder sua função provinciana. Natal era, na boca de todos, uma Rio de Janeiro pequena, com todas as modas e trejeitos de cidade pequena, metida à grande, não tenhamos a menor dúvida. Então, como dizia Jair Rodrigues em Disparada: "prepare o seu coração para as coisas que eu vou contar..."
Foi o início dos hot-dog\'s, então vendidos na Kyxou, em primeira mão. Lembro-me das portas dos clubes, com as carrocinhas de Big-Dog, Ki-Dog, Xis-Dog. Cachorro-quente de carne que se prezava era o de "Pelé", que ficava, durante a semana, na Quinze, em Lagoa Seca, perto do Feijão Verde e do Bar do Tetéu, onde hoje existe o Midway.

Saboreávamos os refrigerantes: Coca-Cola, Crush, Grapette e Guaraná Rocha ou Champagne. No Galo Vermelho, os rapazes da época compravam frango assado, para tira-gosto das bebidas, como: Rum Montilla, cerveja, whisky, Drink Dreher, etc. Nos restaurantes, os abstêmios bebiam água mineral Santos Reis, em garrafinhas de vidro, com ou sem gás. Nas ruas podia-se tomar um sorvete Maguary ou Big Milk. O resto era din-din!

As rodinhas eram formadas, no fim da tarde, na Kyxou, para tomar sundae/ milk-shake ou um hot-dog. Lá se reuniam as moças e os rapazes da sociedade que assistiam, indiferentes, aos desfiles de moda e dos carrões equipados (Fuscão, Maverick, Opala, Karmann-ghia) e rebaixados, ao som de toca-fitas Rodstar ou Clarion de última geração. Natal sem tatuagens, drogas ou violência urbana, problemas tão comuns, hoje em dia. Aquele sim era tempo bom! Natal do Xique-xique... lá no Posto São Luiz da Av. Salgado Filho.
Já existiam os pegas que, na maioria das vezes, eram feitos no "barródromo", em Capim Macio. Não cito nomes para não fazer injustiças. Ainda sofria-se certa influência de James Dean, no filme Juventude Transviada. Hoje, felizmente, essa perigosa moda entre os jovens acabou. Depois dos "pegas" nos reuníamos no Teco-Teco, o bar de Geraldo em Capim Macio. Gasolina azul! Ingrediente ativo no tanque dos carangos dos boys da época estava à venda no Posto Pitombeira/ Tamarineira/ Miguel Barra, pelo que me lembro.
Ouvia-se bossa nova com a mesma frequência do rock. As radiolas Hi-Fi, Telefunker e Phillips tocavam freneticamente LP\'s e compactos de Roberto Carlos, Jerry Adriani, Ronnie Von, Wanderley Cardoso, Wanderléa, Martinha, Celi Campelo, Nelson Gonçalves, Beatles, The Fevers, Renato e seus Blue Caps, Credence e Santana. Também escutávamos no rádio, às 18 h, Jerônimo, o Herói do Sertão, o eterno noivo de Aninha, que, ajudado pelo fiel moleque Saci, fazia qualquer valente tremer.
Nos sábados a tarde, quem ficava em casa assistia os programas de auditório do Chacrinha. Quem quer bacalhau? À noite, as meninas assistiam na televisão a novela "O Bem Amado" de Dias Gomes, na Rede Globo.
No dia 29 de outubro de 1970 era inaugurada a "Casa de Hóspedes de Ponta Negra", com apenas 14 apartamentos. Um mês depois foi inaugurado o Balneário do Sesc, Ponta Negra, que logo se tornou o local preferido para o banho de mar de vários grupos de rapazes e moças.
A partir dos anos 70 começou a expansão urbana de Ponta Negra, com a construção dos primeiros conjuntos residenciais. Os compositores eram responsáveis pelas partituras das músicas que os maestros conduziam e os músicos executavam. A geração 70 reunira tudo isso harmonicamente, num só lugar: no Festival de Woodstock (1969).
A profusão de conjuntos de rock em Natal era crescente, lembro-me do The Jetsons, Impacto Cinco, Os Terríveis e Apaches.
Estava aumentando o número de hippies, darks e punks, que, antes dispersos, passam a agrupar-se na Praça Padre João Maria ou na Praia do Meio, em frente ao Salva-Vidas da Praia dos Artistas.
Liam-se muitos gibis: Bolinha, Luluzinha, Capitão Marvel, Tarzan, Jim das Selvas, Pato Donald, Batman, Zorro e outros. As revistas mais lidas eram: O Cruzeiro, Manchete, A Cigarra.
Alguns autores que se destacavam: Graciliano Ramos, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade. Na Livraria Universitária, da Av. Rio Branco - Centro, batia ponto a fina flor dos escritores potiguares, recebidos cordialmente pelo Sr. Walter Pereira.
No Rio, o colunista Ibrahim Sued; em Natal, Jota Epifânio e Adalberto Rodrigues apresentavam, em suas colunas, o jet set da "capital espacial" do Brasil.
Assistíamos na TV programas como: A Praça da Alegria, J. Silvestre, Família Trapo, etc.

Nos cinemas Rex, São Luiz e São Pedro, domingo pela manhã, era onde se assistia os seriados de Zorro, Rin-tin-tim, Roy-Rogers e degustava-se o irmão mais velho do Baton: o Leite e Mel, ao lado dos torrones, das balas gasosas e dos Drops Dulcora, de cevada, anis e coca, sem esquecer dos Toffees Déa, muito populares na época. Tivemos o privilégio de assistir bons filmes em Tecnicolor, como: Mobby Dick, Os que Sabem Morrer, Love Story e outros, no Rio Grande, Rex ou Nordeste, pois não mais existia o cine Poty em Petrópolis, nem o Polytheama na Ribeira.
Nos domingos à noite, a partir das 19:30h, íamos para o ABC, animado ao som do Impacto Cinco. Os garçons eram Perneta e Bem-Te-Vi, entre outros, e as bebidas pedidas eram cuba libre e hi-fi, mais consumidas do que as cervejas, estas em casco escuro ou claro. A cerveja em casco escuro já era mais apreciada do que a de casco claro.

Alguns preferiam ir ao Hippie Drive-in, na estrada de Ponta Negra, com luz negra e outros babados. Outra pedida também era uma esticadinha à Tenda do Cigano, Peixada Potengi ou, quando sem dinheiro, a opção era o cachorro-quente do Souza, no beco da Casa Rio.
As noites eram tocadas pelo Hippie Drive-in, Piri-Piri e Girassol. Existia o bar Barreirinha, outro ponto de encontro da mocidade. O acesso a Ponta Negra era pela antiga estrada, construída pelos americanos, até a altura do velho Posto Planalto. Daí, prosseguia-se pelo calçamento, chegando à orla marítima e seguindo adiante, até Pirangi, onde tínhamos o caranguejo do Pinoca.

Em Petrópolis, frequentava-se a Confeitaria Atheneu, o Gramil e o Kazarão.
Na Praia do Meio, O Jangadeiro, depois da boate do Hotel Reis Magos, para uma noite de serestas com o inesquecível Expedito. Também éramos clientes assíduos do Aeroclube e do América, onde se comiam as refeições mais sofisticadas, com a mesma naturalidade que se tomava um caldo de feijão na Tenda do Cigano.

No Tirol, o Stop era frequentado por uma porção de jovens, vindos do bairro e adjacências, que nos dias em que na AABB ou no América tinha baile (não show) fazia a alegria dos garçons. Quem atendia eram os garçons: Bem-Te-Vi e Perneta. Depois da festa ou arrastão (época de São João), lanchava-se lá pelas 3 da madrugada no Dia-e-Noite, lanchonete com bastante movimento, localizada no Centro. Posteriormente, veio o Passaporte Lanches, de Peninha, na Praça Pedro Velho.
Dos carnavais inesquecíveis lembramos os do América, Aero, AABB, ABC, Iate Clube e Assen, valendo a pena lembrar que os carnavais do América eram sempre tocados pela orquestra de Waldemar Ernesto.
Em Natal, tudo era charmoso, na década de 70, quase sem violência urbana.

(*) Elísio Augusto de M. e Silva, empresário, escritor - Transcrito de O Jornal de Hoje

3 comentários:

Alexandre Disraelly disse...

Parabéns pelo blog e obrigado pela visita.

Anônimo disse...

Rapaz...... quantas saudades! aquele sim era tempo bom....só faltou falar em algumas brincadeiras de crianças e adolescentes abaixo dos 17 anos: carro de rolimã (também chamado patinete), roladeira de lata de leite em pó, tábua de morro (ou TALBA de morro, etc... etc.
Viajei!!!

Anônimo disse...

Um resgate de ouro de uma época tão fervilhante de Natal...
abç Orlando Reis