20.10.10

O HQ 129 X e a musica fractal dos sapos.

Por José Bezerra Marinho

O primeiro e mais constante, vinha do quarto ao lado ao que eu nasci.

O do receptor HQ129 X do meu pai, radioamador.

Cresci com aquela música, ruídos, encantamento ao saber que dali, daquele seu quartinho ele falava e ouvia o mundo. Minha mãe me lembrava sempre que, no dia que nasci meu choro – que meu pai chamava QRM, código de interferência no jargão de rádio - foi mandado por ele para os seus colegas mundo afora. Quando soube disso fiquei todo besta. Só depois fiquei insuportável.

A chuva que, desavisadamente, desabava nas noites da Afonso Pena, trazia com ela a musica fractal dos sapos, redivivos, no leito de uma avenida que virava lagoa durante a noite entre Açu e Mossoró, não os rios ou municípios, mas as ruas do Tirol.

Como era possível? Na cabeça do menino de minha saudade não havia resposta. Até ontem não havia chuva, não havia lagoa, não havia sapos. De onde eles vinham? Como sabiam que a lagoa se formara?

Seco, alto, enorme aos meus olhos, com vastas mãos, meu pai explicava: “estavam aí”, apontando do terraço da casa para a rua. Estado latente, quietos, esturricados, ainda mais feios, mas vivos!

Independente de chuva e sapos, todos os dias a manhã se anunciava ao som de madeira sendo serrada.

Em frente, exatamente em frente à minha casa, a serraria de Plínio Saraiva. A madeira gemia ao encontrar a serra. Um gemido mais baixo que ia num crescendo até a tora ser vencida. A madeira serrada era posta em pequenas caixas que eram entregues nas casas. É... esconder pra que? Naquele tempo, a maioria dos fogões domésticos era a lenha.

Havia algo de irreal, custei mesmo a acreditar, quando pela primeira vez ouvi Aluízio Menezes narrando um ABC e América, gritar gooooooll, sem que antes tivesse ouvido a explosão da frasqueira da geral do “Estádio – e haja boa vontade – Juvenal Lamartine”.

Sons das tardes de Domingo, ABC e América, noites de quarta feira, Riachuelo e Atlético, sempre havia um coro, ohhhhh, nas bolas perdidas, e explosão apoteótica num gol de Cezimar, ou Saquinho, ou Jorginho, ou Alberí.

Alguém aí já (ou) viu avião “pedindo carro”? Esse era outro som mágico. O avião de João Pinheiro “pedindo carro”.

Chegando a Natal, o aviador e os passageiros do seu táxi aéreo, pousariam em Capim Macio e precisavam de um “carro de praça”.

Meu vizinho, João sobrevoava sua casa e, a baixa altitude, balançava as asas e rraumrraumava o motor, era o sinal. D. Cleide ia pra minha casa e ligava para o 2100 ou 2300, e pedia um “carro em capim macio para João Pinheiro”.

O fim da tarde chegava com Cambraia anunciando o “Jornal de Natal” de Djalma Maranhão.

Cambraia - perfeito biótipo e porte de um príncipe banto - soltava uma cantiga que, muitos anos depois, penso ter reconhecido em Catoca, nas Lundas, no coração de Angola.

Mas aí eu já tinha crescido, os sapos haviam sido expulsos pelo asfalto e havia visto quando meu pai, poucos dias antes de sua morte, desligou para sempre seu HQ 129 X.

4 comentários:

João Brito disse...

Excelente texto.Parabéns.

Rodrigo Rocha disse...

Manoel passei para conhecer seu blog ele é not°10, show, espetacular, muito maneiro com excelente conteúdo você fez um ótimo trabalho desejo muuito sucesso em sua caminhada e objetivo no seu Hiper blog e que DEUS ilumine seus caminhos e da sua família
Um grande abraço e tudo de bom

Anônimo disse...

olá amigo, tudo bom? não tenho tempo no momento para ler essa postagem, passo para avisar que fiz uma referencia a seu blogger no meu. clica no nome ENADE-2010 (página do blogger). se quiser comentar a respeito fica a vontade. obrigado pelas informações sobre o atheneu.
fragmentosdalei.blogspot.com

Celina disse...

Muito bom os comentários não são do meu tempo, eu sou um pouquinho mais para cá, mais é com saudades que leio qualquer assunto sobre natal, eu morei em tirol e estudava no Alberto Torres, em Petropolis, quando terminava a aula ia para a balaustrada junto com um bando de colegas,ver o mar lá de cima.De vez em quando , quando as saudades apera dou um polinho lá para matar as saudades, mais é outro Natal que encontro muito bonito por sinal , os amigos da minha época muitos morreram ou se mudaram,Aí que as saudades bate forte , mis tenho tudo na minha cabeça como se fossem um filme, um Natal diferente. bem amigo por hoje chega um abraço. Celina