A vida boêmia de Natal - 1939
(Elísio Augusto de Medeiros e Silva)
Por volta de 1939, início da II Guerra Mundial, os cabarés mais famosos de Natal situavam-se na Ribeira.
Bastante freqüentados, eram muito populares, fazendo parte integrante da vida boêmia da cidade, que se iniciava depois das 9 horas da noite, quando as famílias já tinham se recolhido.Na vida noturna provinciana encontravam-se as prostitutas, os cáftens e os gigolôs, que também serviam de inspiração aos poetas e escritores.
Naquela época, a cerveja era vendida ao preço de mil e quinhentos réis, sendo uma das bebidas mais consumidas pelos pândegos da boemia.
As mulheres da zona pediam martini aos acompanhantes, que era servido ao preço de cinco mil réis a dose. A popularização do uísque ocorreu somente depois, com a chegada dos americanos a Natal.
Nos cabarés, às vezes, aconteciam pelas madrugadas brigas e pancadarias, entre os freqüentadores, sendo necessária a presença da polícia, para acalmar os mais exaltados.Normalmente, dentro das pensões alegres existia uma figura andrógina, alegre, com requebros e trejeitos femininos, cabelos oxigenados, muito conhecida pelos freqüentadores. Por aquela época, uma era conhecida por "Afago verde".
Nesse tempo, as parteiras eram responsáveis por grande parte das vidas que surgiam. O parto era feito em casa, com o resguardo de vários dias e muita canja de galinha. Em partos mais difíceis, surgia o médico, com a sua inseparável valise e o estetoscópio.As pensões alegres eram freqüentadas por pessoas de diferentes níveis sociais. À noite, já com o dólar correndo solto, surgiram os vendedores clandestinos, que vendiam perfumes, isqueiros, sabonetes, whiskys, cigarros, etc.
As músicas mais tocadas nas radiolas de ficha eram os tangos e maxixes, que, aos poucos, foram sendo substituídos por swings, blues e fox trotes, já na década de 1940.
Naqueles anos, apareceu na zona uma novata: morena, de olhos e cabelos negros, que circulou por várias casas noturnas e despertou a paixão de muitos freqüentadores. Os seus pretendentes eram selecionados pela disposição de abrir a carteira. Contam que ela terminou os seus dias abandonada e esquecida no Beco da Quarentena, tomando injeções diárias de "914", aplicadas por um enfermeiro da Saúde Pública aos portadores de sífilis. A profilaxia era uma lavagem à base de permanganato.
As notícias da guerra, via BBC Londrina, transmitidas pela Agência Pernambucana, antes da inauguração da REN - Rádio Educadora de Natal, eram geralmente acompanhadas pela "Canção do Expedicionário", que traduzia a saudade da pátria e a esperança de vitória dos Pracinhas Brasileiros, na Itália. Por ali se tinha notícias dos últimos acontecimentos da II Guerra Mundial na Europa.
No Cine Polytheama, na Praça Augusto Severo, Ingrid Bergman, Diana Durbin, Judy Erland e outros artistas encantavam os telespectadores.
O movimento do Porto, ali perto, era intenso, guarnecido pelos fuzileiros navais que, sob o tema "Adsumus", que significa "aqui estamos", eram admirados e respeitados pela população, em virtude do exemplo de dedicação e profissionalismo em defesa da pátria.
As notícias da noite corriam velozes, de boca em boca, e terminavam no Grande Ponto, ou no Bar Cova da Onça, na Av. Tavares de Lira, onde o garçom "Cara larga" atendia aos clientes, na parte de trás do Estabelecimento. Muitas dessas histórias já modificadas pelo povo.
Assim era a vida noturna da Natal boêmia do início dos anos 40.
2 comentários:
Meu caro,
o texto sobre Maria Boa já se encontra no Balaio. Agora, vou espiar esse aqui. O tema "cabaré" também se faz presente, né?
Um abraço.
Chego através do blogue do amigo Moacy Cirne. Saio com uma ótima impressão. É muito bom preservar a memória de uma cidade através da lembrança de pessoas que fizeram História, como Maria Boa e tantas outras que não tiveram um título universitário,não foram intelectuais, mas deixaram lições de vida. Um abraço.
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