Parece oportuno verificar o que comia e bebia o natalense no fim do século XIX: as frutas, os peixes, os doces, as bebidas, os pratos típicos.
Nos dois mercados, além da feira no Passo da Pátria, encontravam-se várias frutas apanhadas nos sítios e matas em redor da cidade. Umas abundantes ainda hoje. Outras, já raras. Por exemplo: eram e continua abundantes, a mangaba, os cajus, cajaranas. Mas já não é fácil, nos mercados, frutas como a massaranduba, guabiraba, camboins, oitis, ingás de corda, como ele chamava. E outras que poucos conheceram, como as ubaias e os guajerus. Todavia, para colher essas frutas, havia que enfrentar os inimigos traçoeiros dos matos: as formigas de fogo, cobras nas moitas e vespas na galhada. As caças mais abundantes na época eram os jacus, inhambus, cotias e tatus.
Diz Lindolpho Câmara que não havia terra com maior abundância de peixes e crustáceos do que Natal daquela época. Trazidos pelas jangadas dos pescadores, enumeravam-se a cavala, o dentão, a cioba, o pargo, a pescada, a bicuda, o dourado, a corvina, o beijupirá e o cação. Nas praias, através dos currais ou da pesca de arrastão, com tresmalhos ou tarrafas, estavam as tainhas, sardinhas, espadas, palombetas, galos, carapebas, carapicus, bagre, baiacu, agulhas e agulhões. Pescados nos mangues e recifes da Fortaleza, lembra os camarões, lagostas, lagostins, caranguejos, siris e aratus. Outras variedades eram os ouriços, ostras, mariscos, unhas de velho e polvos. De Ponta Negra, apesar da “longitude da travessia”, vinham os xaréus. Quanto à carne verde, o autor informa que eram abatidas duas rezes nos dias comuns e três, do sábado para o domingo e dias festivos, para toda população.
A venda dos peixes, nos mercados, era feita tradicionalmente anunciada pelo eco de um grande búzio, “soprado por sujeito de fôlego e que estrondava pela cidade silenciosa até os seus confins”.
Os pratos típicos mais famosos parecem que eram as “dobradinhas”, “cobiça dos gastrônomos”, diz o autor, feitas com “livros” ou “folhoso”. A propósito desses “livros”, conta uma anedota de certo tipo popular, o negro Moisés, servente ou oficial de justiça, que andava sempre de sobrecasaca e cartola. Ao cruzar com o juiz de direito, sobraçando um “livro” (estômago de boi), indagou a autoridade:
- O que levas aí, é a Bíblia?
Resposta rápida do negro:
- Não senhor, é o Código Penal.
O autor faz referências a outros pratos cuja fama chegou até nós: os mocotós, para as mãos-de-vaca ou panelada; os miolos, para as fritadas; as tripas e lingüiças.
Das bebidas, só há registro da cachaça de Papari, que ele chama “a deusa dos ébrios”, e a “laranjinha”. Para as pessoas de categoria, havia a “Genebra de Holanda”, importada em botijas de barro vitrificado.
Já há cem anos certas bebidas se confundiam com remédios poderosos: a Genebra era receitada também para cólicas intestinais, defluxeiras, espinhela caída, maus-olhados, sarampo e bexiga recolhida... Hoje, a cachaça corta resfriado e o uísque é bom para o coração...
* Veríssimo de Melo - Foto: Jaeci - Areia Preta
Um comentário:
Uma comida bem típica, mesmo. Ainda persiste o hábito nesta nossa terra. Por sinal, deu vontade de comer um picado com cuscuz...
Abração!
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